Liminar obriga suspensão de atividades em três usinas hidrelétricas de Itaúna
Uma liminar obtida pelo Ministério Público Federal (MPF) em Divinópolis e o Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) obriga duas empresas responsáveis por três barragens de geração de energia em Itaúna, a suspenderam as atividades hidrelétricas e de captação de água até que, em 40 dias, haja regularização dos relatórios de estabilidade e do Plano de Ação Emergencial. Ambos documentos já foram apresentados ao MP, no entanto, foram avaliados pelo órgão como genéricos e omissos.
A Justiça também cobrou que neste prazo, a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) fiscalize as estruturas. O G1 solicitou nota de esclarecimento à empresa responsável e à Aneel, no entanto, não obteve retorno até a publicação desta reportagem.
Segundo o MP, as três hidrelétricas, com seus respectivos reservatórios, estão instalados no Rio São João, um subafluente do Rio São Francisco e, de acordo com o que foi divulgado pela Justiça Federal, a liminar obriga a Companhia Itaunense Energia e Participações e a Companhia Tecidos Santanense a suspenderem imediatamente as atividades de geração de energia elétrica e captação de recursos hídricos nas usinas Coronel João Cerqueira de Lima (Barragem do Caixão), Doutor Augusto Gonçalves de Souza (Barragem Angu Seco ou Velha) e Coronel Jove Soares Nogueira (Barragem do Benfica, do Nogueira ou Nova), até regularização e posterior deliberação judicial. O MP também esclarece que a Companhia Tecidos Santanense é co-proprietária de duas das barragens citadas.
O MPF de Divinópolis e o MPMG, determinaram que as empresas apresentem à Agência Nacional de Energia Elétrica, no prazo improrrogável de 40 dias, o resultado de auditoria técnica independente, realizada por empresa com reconhecida expertise, que, após inspeção para verificar a categoria de risco e o dano potencial associado às barragens, relate à atual condição de estabilidade e segurança das três estruturas.
MPF e MPMG obtiveram liminar para impedir atividades em barragens hidrelétricas em Itaúna — Foto: Reprodução/Tv Integração
Investigação
A investigação sobre a situação das barragens ocorreu logo após o 2º Pelotão do Corpo de Bombeiros do Estado de Minas Gerais ter solicitado apoio do MPMG para obter documentos relativos à segurança e estabilidade das estruturas no Estado.
O MP disse que a Companhia Itaunense Energia e Participações, proprietária das três barragens, foi então notificada para apresentar, entre outros documentos, os licenciamentos das instalações, estudos que apontam eventuais riscos de rompimento, laudos de estabilidade referentes aos últimos três anos, outorga para a utilização dos recursos hídricos e os Planos de Ação de Emergência (PAE).
No entanto, em resposta, o MP disse que a Itaunense enviou relatórios de inspeção meramente visual, realizados sem a utilização de quaisquer instrumentos de escuta, mas apresentados como se fossem laudos de estabilidade, segundo os quais a situação da Barragem Angu Seco foi considerada em estado de "atenção".
Foram constatados, então, indícios de que o comportamento e a estabilidade das estruturas estavam diferentes das condições estabelecidas no projeto, enquanto as demais foram classificadas como apresentando nível "normal" de segurança.
Em seguida, a empresa apresentou os Planos de Ação de Emergência das barragens, que foram considerados omissos e genéricos.
"Além de sequer indicar as providências que seriam tomadas para alertar as comunidades ou para mitigar os danos em caso de rompimento, continham informações inespecíficas, que poderiam ser aplicadas a qualquer uma das estruturas. O Ministério Público também apurou que as usinas hidrelétricas não possuem licenciamento ambiental, tampouco outorga de uso de recursos hídricos", ressalta o MP.
Ausência de fiscalização
Diante das irregularidades e da constatação de que as responsáveis pelas barragens não estão executando as obrigações legais de segurança, o Ministério Público oficiou à Aneel para que o órgão federal cumprisse com sua obrigação de fiscalização.
Contudo, a agência informou que não se considera responsável por essa fiscalização, porque, devido ao baixo volume de geração de energia elétrica que cabe a cada central hidrelétrica, tais instalações são dispensadas de outorga, autorização e mesmo de licenciamento ambiental.
Novamente questionada, a Aneel reafirmou que não é o órgão competente para fiscalizar, disse que teria exigido a documentação dos empreendedores, mas que não a teria recebido.
Possíveis danos Ao ajuizar a ação, os Ministérios Públicos relataram a possibilidade de ocorrência de gravíssimos danos sociais e ambientais decorrentes tanto da omissão das empresas que operam as barragens quanto da Aneel, com o risco de perda de vidas humanas, o soterramento de vegetação, edificações, estradas, cursos d'água, nascentes e mananciais de abastecimento e a ocorrência de graves danos à fauna.
"Para o Juízo da 2ª Vara Federal de Divinópolis, é "estarrecedor perceber o quão pouco, ou nada, aprendemos com as tragédias de Mariana-MG (2015) e Brumadinho-MG (2019), que, juntas, ceifaram as vidas de aproximadamente 300 pessoas, entre mortos e desaparecidos, isso sem contar os imensuráveis danos ambiental, social, cultural e patrimonial associados a tais eventos", relata o MP.
Ainda de acordo com o MP, a "situação revela mais um caso de flagrante desrespeito aos direitos fundamentais da pessoa humana, ao mesmo tempo em que escancara a negligência e ineficiência do poder público, em especial da Aneel, na gestão dos riscos inerentes a atividades econômicas potencialmente causadoras, não só de impactos ambientais, mas de caos social e na saúde pública, com risco à vida humana".
Fiscalização A decisão cita a Lei 12.334/2010 , que impõe à entidade que concedeu ou autorizou o uso do potencial hidráulico para fins de geração elétrica a obrigação de fiscalizar a segurança das barragens, para dizer que o fato de determinados empreendimentos possuírem potência inferior ao daqueles em relação aos quais é exigida prévio licenciamento ambiental "não retira da Aneel o dever de fiscalizar a atividade com o fim de averiguar sua completa adequação à legislação vigente", reafirma o texto
